domingo, 15 de março de 2009

"Who watchs the Watchmen?"

"À meia-noite, os agentes e super-humanos saem
pra prender todos que sabem mais do que eles"
(Bob Dylan, Desolation Row)

No último dia 6, chegou aos cinemas a adaptação da graphic novel tida como a obra-prima do roteirista Alan Moore: Watchmen. A despeito do fato de que aguardava ansiosamente o lançamento desde outubro do ano passado, pus-me a pensar: como tem aparecido filmes baseados em quadrinhos ultimamente! Três filmes do Homem Aranha, dois do Batman (sem contar os quatro "antigos"), dois do Quarteto Fantástico (com direito ao Surfista Prateado pegando uma onda no segundo), um "revival" do Superman, Homem de Ferro, três X-Men e vindo um contando a origem do Wolverine... Nesse meio, como imaginação pouca é bobagem, o Hulk veio parar em plena Favela da Rocinha com direito ao FBI subindo o morro - inveja do BOPE? Claro que isso não podia dar certo: o verdão "Dr. Jekyll and Mr. Hyde" moderno conseguiu a façanha de, duma cena pra outra, saltar do Rio de Janeiro direto pra Guatemala! Não fosse uma tremenda burrada, seria tão genial quanto o famoso corte de Kubrick em 2001: Uma Odisseia no Espaço! Mas o que me chamava a atenção é que eu, em minha quase total ignorância do universo (ou, em alguns casos, multiverso) das HQ, já tinha ouvido falar em praticamente todos esses citados aí em cima. Watchmen, junto com Constantine, A Liga Extraordinária, V de Vingança, Sin City e 300, entra num outro grupo: os menos conhecidos. Ou melhor: conhecidos pelos "iniciados", pelos frequentadores de lojas especializadas.

Quando criança, me deleitava com os gibis da Turma da Mônica e Duck Tales. Na adolescência, escolhi não partir para as óbvias HQ de super-heróis ao recusar solenemente o conselho do jornaleiro para comprar "A Morte do Superman". Então, aceitei que meus heróis ou morreriam de overdose, ou seriam ganhadores do Nobel. Um cara que se veste como morcego? Outro que usa a cueca por cima da calça? Eles não fariam parte da minha vida. Seriam apenas um capítulo vago, uma visão distante. Mas eis que, de repente, surge uma oportunidade de "tirar o atraso": depois de anos de conversa, finalmente ia sair um filme do Homem Aranha... Beleza! Pra que ler aquele montão de revistinhas? Se esse filme desse certo, lançariam mais um monte de filmes de super-herói. E aí, Saga do Clone, A Piada Mortal, Crise nas Infinitas Terras, Marvel vs DC, hã? Fui ao cinema feliz da vida: toda a adolescência que eu teria passado em cima daquelas revistinhas ia ser comprimida em duas horas de ação hollywoodiana!

Só que eu não contava com um detalhe. Meu futuro reservava uma amizade com uma pessoa "do outro lado", alguém que adora HQ, mangás, animê etc: a Fernanda. Depois de não conseguirmos ir ver Homem de Ferro juntos, fomos a'O Incrível Hulk e Batman - O Cavaleiro das Trevas. O escorregão bizarro do Hulk acabou com qualquer chance de uma análise séria do filme. Mas o que me chamava a atenção era a análise que Fernanda fez do Cavaleiro das Trevas: sabe a aclamadíssima atuação de Heath Ledger? Fez muito o gosto dela não... "Funcionou dentro do filme", disse ela, da mesma forma como eu tinha achado que a de Jack Nicholson tinha funcionado no filme de Tim Burton. "É porque você não leu A Piada Mortal. Aí você ia entender o Coringa...". Percebendo o vazio que era meu suposto conhecimento sobre super-heróis, ela decidiu me emprestar um verdadeiro tesouro: todos os doze capítulos da série Watchmen - que, até então, eu simplesmente nem tinha ouvido falar! Li a graphic novel, achei-a brilhante em roteiro e desenho (melhor que muito livro!), mas não sabia que o filme estava sendo preparado. Ela já. E assim, no último dia 12, fui ao cinema para, pela primeira vez, ver um filme de super-herói com conhecimento da história original. Faltou a Fernanda ir junto... Mas isso até teve um lado interessante: não me concentrando tanto no filme, olhei para as pessoas.

E foi aí que eu entendi porque tinha gostado dos outros filmes desse tipo que já tinha visto. Porque quem vai assistir aos filmes de super-herói não é só quem já leu as histórias, mas principalmente quem nunca as leu. É por isso que acontecem mudanças que, muitas vezes, os fãs de HQ consideram imperdoáveis. Às vezes, como no caso de Watchmen, a mudança cria buracos no roteiro e prejudica o filme - a meu ver, o filme não é autocontido, o que eu acho primordial em qualquer obra cinematográfica. Em outros casos, a saída é diferente: trabalhar não a história, mas o personagem, como foi muito bem feito em Homem Aranha 2. O problema é que quem não leu as histórias originais não se dá conta disso. E sai do cinema achando que sabe tanto quanto o "esquisitão" que as lê há anos... Daí, quando pessoas desses dois "mundos" se encontram para discutir o filme, às vezes acontece uma situação parecida com a sugerida pelo Coringa de Heath Ledger: o encontro de uma força que não pode ser parada com um objeto que não pode ser movido. Alguém que usa argumentos de autoridade e alguém que usa argumentos como autoridade... Problema? Bem, se quem já conhecia as histórias assumir que a mera transposição dos quadrinhos para as telas não seria tão interessante quanto algo novo, um problema resolvido. E se quem não conhecia as histórias originais se animar a conhecê-las, então tudo bem. Bom senso, humildade e...

Cada macaco no seu galho
Chô, chuá
Eu não me canso de falar
Chô, chuá
O meu galho é na Bahia
Chô, chuá
O seu é em outro lugar...

3 comentários:

Anônimo disse...

Hapha

adorei o seu texto, amigo! Como vc sabe, daquela turma que "não leu gibis" faço parte também, e ao ler a sua experiência até me deu vontade de conhecer um pouco mais!

Um grande abraço!

Fábio Fortes disse...

Hapha!

Adorei o seu novo texto!
Como vc sabe, daquela turma que "não leu gibis" faço parte também, e ao ler a sua experiência até me deu vontade de conhecer um pouco mais!

Um grande abraço!

Unknown disse...

Está faltando o longa da Mônica e sua turma! rsrssrss
Ótimo texto.